sábado, 31 de dezembro de 2011

Nova Chance


Pode ser só mais um dia no calendário, mas alguma coisa aqui dentro parece querer mudar. Aquela fagulha adormecida que talvez queira incandescer, queimar forte; o sorriso trancado no armário procura a chave para sair; o ócio, sentado na cadeira, resolve caminhar no parque (que horas são?).

A fagulha explode e mil fogos brilhantes iluminam o céu, acendem meu rosto e um riso tímido se destranca. Prometo deixar a barba crescer, prometo ser mais clichê às vezes sem que isso me envergonhe, prometo me dar mais uma chance sempre que necessário; não vou me contentar apenas com lápis, café e verbos.

Quando amanheceu, continuei caminhando. O ar parecia mais leve. Ouvi meu nome ao longe, mas não virei o rosto para olhar. Eu sabia que nunca se deve olhar ou então tudo se dissiparia, mesmo antes de começar. De cabeça erguida, segui. Era minha hora de protagonizar romances de capa e espada, com pistolas e conhaque.

Feliz 2012 para todos!

sexta-feira, 30 de dezembro de 2011

Vestida para o Ano Novo


Para o réveillon, entre vermelho-paixão, amarelo-riqueza, verde-calmaria e branco-mansidão, ela achou melhor ir vestida de arco-íris.

sábado, 24 de dezembro de 2011

O Natal, este ano


O velho abandonou o copo de whisky e o charuto recém-aceso, conferiu o relógio, vestiu o casaco vermelho e pegou o saco de presentes. Sentou no banco do carona no trenó. Essa noite, Mamãe Noel iria dirigir.

quinta-feira, 8 de dezembro de 2011

Vinte e dois


Aos vinte e dois anos, ele cansou de brincar de ser adulto, mas já era tarde para voltar atrás.

segunda-feira, 24 de outubro de 2011

um ano em um mês


foram festas, viagens, amassos, motéis, brigas, reconciliações, ataques fulminantes de paixão, de ciúmes, de desespero.

foi forte, intenso.

depois foi a indiferença.

e tudo em um mês, que mais pareceu um ano.

quarta-feira, 5 de outubro de 2011

Gêmeas


Anelise e Anelore, ainda que gêmeas idênticas, apenas se consideravam fruto de uma barriga sem criatividade.

quinta-feira, 29 de setembro de 2011

Tempos insaciáveis


O casal ainda estava deitado na cama. Peles suadas, peitos arfando, em busca de ar. Tudo fora tão mágico... mas tão incompleto; mesmo quando ele estivera dentro dela, como há pouco. Faltava algo, precisava de mais, cada vez mais.

Por alguns segundos, de olhos fechados, ela se transportou dali, o ritmo do corpo voltando ao normal. Lembrou-se de outros tempos, tempos de menina, em que apenas um beijo era suficiente.

Por que não se entregar a outros? A vários? Talvez se sentisse completa, preenchida. Não. Ela não era assim. Deixaria a canalhice reservada apenas ao sexo masculino.

Despertou do transe com a respiração forte de seu homem adormecido ao lado. Aconchegou-se nele e numa prece quase infantil só conseguia repetir baixinho: “Por favor, seja o suficiente! Por favor, seja o suficiente!”, antes de cair no sono também.

segunda-feira, 26 de setembro de 2011

Abismo


Tudo aconteceu por acidente, um tropeço.
E então caiu
        caiu
        caiu
        caiu
        caiu
        caiu
        caiu
        caiu
        caiu
        caiu
        caiu
        caiu
        cai
        ca
        c
        caiu e nunca mais se encontrou.

terça-feira, 20 de setembro de 2011

O imortal esquecido


A busca pela imortalidade deixara o ex-coronel e ex-boêmio Alexander Rubemberta exausto em demasia. Não se lembrava mais de família e amigos e estes com certeza não se recordavam de quem ele era (ou foi).

O dia teimava em não passar e o céu estava paralisado, tingido de laranja como se o pôr-do-sol durasse horas. Parecia eterna a escalada que Alexander Rubemberta fazia para chegar ao cume da Montanha Aurora, sentindo o ar rarefeito e a brisa congelando seus ossos velhos.

No topo, encontrou a velha cabana que imaginava encontrar, a grande pedra que imaginava encontrar, mas um ancião do qual não fazia ideia de sua presença; este último fato, entretanto, lhe trouxe um lampejo de esperança.

– Meu senhor, eu conseguirei? – Alexander Rubemberta perguntou esbaforido, sem saber com que nome tratar o velho homem, e caiu aos seus pés.

– O sol há de nascer amanhã?

O ex-coronel e ex-boêmio não disse nada. Sim, o sol nasceria amanhã, mesmo que o dia fosse nublado.

Com dificuldade se levantou e ambos caminharam até a grande pedra, que parecia ser maior ainda do que anteriormente descrita.

O ancião retirou pequenas ferramentas do bolso de sua túnica, ajoelhou-se e começou a talhar a pedra. Não demorou mais que poucos minutos.

– Pronto. És imortal agora. – o velho disse levantando-se e indicando o local na pedra em que acabara de gravar o nome do recém-chegado.

Alexander Rubemberta aproximou os olhos e viu seu nome bem pequeno na pedra tão imensa; e não era só isso. A pedra estava coberta de nomes, milhares ou mesmo milhões deles. Agora ele também era um imortal,como todos os outros.

– Venhas, imortal. Tomarás um chá comigo.

E os dois desapareceram dentro da cabana.

terça-feira, 13 de setembro de 2011

O quase-amor-dividido


Mais um daqueles beijos doces e eu não sabia quanto tempo eu poderia resistir. Era como um jogo... Isso! Você estava jogando comigo. “Dou mais um beijo e veremos quanto tempo ele resiste”, tenho certeza que era isso que se passava em sua cabeça.

Seu beijo me enlouqueceu um pouco e hoje me dou conta disso. Me apaixonei por sua pele alva, macia, que me faz querer tocá-la de leve com a ponta dos dedos e sentir sua eletricidade.

Eu era egoísta. Quando te fazia rir era só para ver seu rosto corando, suas maçãs tão vermelhas, parecendo ter abusado da maquiagem. Eu sorria por dentro. Você parecia um pouco frágil nessa hora. Um pouco humana, um pouco minha.

E mesmo quando você disse que tinha outro, eu não me importei. Eu precisava de beijo-doce, pele-macia, maçãs-vermelhas, sorrisos-humanos.

Eu ficaria satisfeito com seu quase-amor.
Já estava completamente viciado.

quarta-feira, 7 de setembro de 2011

Homem de promessa



Lembro-me bem de que quando o conheci eu já sabia da sua fama de prometer coisas. Não era advogado, nem político, nem nada do tipo de ter que prometer por profissão. Alguns diziam que era de nascença, outros diziam que era hábito, alergia, falta do que fazer.

Prometia favores e sentimentos e, como criança, cruzava os dedos com a mão nas costas, desvencilhando-se de toda a culpa futura que aquilo pudesse lhe trazer. Quando se promete muitas coisas ao mesmo tempo, às vezes é difícil se lembrar. Por isso que quando prometeu me ajudar, eu dei um sorrisinho amarelo, daqueles de canto de boca, enquanto meus olhos seguiam sua mão que se escondia novamente atrás do corpo.

Acho que, assim como mentiras, as promessas também se transformam em vício. Numa segunda-feira de manhã ele percebera que havia se tornado uma doença. No espelho do banheiro olhou-se e respirou fundo; prometeu a si mesmo que não faria aquilo de novo.

domingo, 24 de abril de 2011

Para não fazer diferença

...anos depois, descobri que meu beijo secreto da namorada não era apenas nosso, e sim de todos os outros antes de mim; que nossa música especial já havia encantado a vida dela para outros ouvidos. Aos poucos, seus olhos disseram que eu era apenas mais um.
Ela me colou em seu álbum e hoje eu fico na estante empoeirada, ao lado do vasinho de flores.

[repostagem]

quarta-feira, 13 de abril de 2011

O tempo de Cristina


Era engraçado como quatro horas em casa brincando de chá inglês com suas bonecas passavam tão rápido para a pequena Cristina e para ela, agora ali, com a faca alojada no abdome, quatro horas poderiam durar uma eternidade.

terça-feira, 15 de fevereiro de 2011

Todas as coisas boas do mundo derivadas de uma certa união






E então havia aquela modinha de unir as mãos em formato de coração.

Com eles, porém, era diferente. Eles se uniam muito mais que coração. Era união de corpo, alma, suor, sorriso, chocolate e cócegas.

E sempre que isso acontecia, eles não eram mais um casal; eram todas as coisas boas do mundo em um só ser.

quarta-feira, 26 de janeiro de 2011

Marinanfetamina queria um descanso


Marina só gostaria que fosse um prazer – e não um compromisso – seu ato de se sentar todo sábado às cinco e meia da tarde na cadeira na calçada.

terça-feira, 4 de janeiro de 2011

Marinanfetamina




Religiosamente, Marina seguia o mesmo ritual todos os dias.
Às 5h55 acordava o marido com um beijo, preparava o café, levava as crianças à escola.
Sem deixar passar nem um minuto, arrumava a casa e preparava o almoço antes que o relógio acusasse ser meio-dia.
12h30 buscaria os filhos na escola; 12h35 ouviria o que eles teriam para contar sobre o dia escolar.
Às 14h lia 30 páginas de algum livro e então tirava um cochilo cronometrado, que se findava às 15h20. Quando fosse 15h30 começaria a preparar um bolo e 16h10 tomaria um banho.
18h era o horário que começava a preparar o jantar para que então às 19h todos estivessem jantando juntos, à mesa.
Quando era 19h30, dava um suspiro de desânimo e enquanto lavava louça (às 20h) já pensava no cardápio do próximo dia.
Assim que seu relógio de pulso marcava 22h colocava as crianças para dormir, ia ao quarto para fazer amor com o marido. Às 22h433 ela fingia um orgasmo.
Exatamente às 22h51 tomava um último banho, trocava o óleo de suas peças e recarregava as baterias na tomada mais próxima.
23h em ponto se desligava.